quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

What I didn't tell


After a while being here in Brazil, life has finally found its pace. I wake up at a certain time. I eat, have lunch, a snack… I walk the dog, see my friends and watch tv. I sleep. And all those things repeat themselves over and over, in a nice rhythm that rocks me and makes me feel home.

Besides my everyday life having found its pace, I have also found many lost things around here. In my room, I found countless notebooks from 10 years ago. They were all there, standing next to 7 year-old receipts. Both in my drawer, waiting for nothing. I found love letters of possible girlfriends from my childhood. All of them now married. I found documents from internships, from school, from nothing. I guess I have looked so much that I even found my allergies, long forgotten.

But even between one sneeze and another, I like to be able to see those old things. Some of them reveal to be useless now and go straight to the garbage can. Others will stay for five more years before finding their final destination. And some others stay. They just stay.

Indeed I have found many stuff. And not only old bank accounts from my 2007 French language course. I have found many old friends these last days. And the good thing is that friends do no stand still, waiting for you, collecting dust. Each one of those friends I met  kept with their lives, with new victories and challenges, new hairs and beards. I was happy to find them here, dustless.

- Hey, Gu! So good to see you again!
- Thereza! I love seeing you again too! How are you?
- Everything is great, new home, marriage…

- Micheli! I loved the new hair!
- Thanks, Gu! Here, I brought you a little something!
- Oh, you didn’t have to. Thank you!

- Oh, Paulinha, here we are in this bookstore again.
- I know, Gu! Actually the sales people even know my name here… I come with Rodrigo every weekend.

- Gustavo Carneiro! How come you still didn’t call me? Did you forget me?
- I’m sorry Leo! I would never forget you! Tell me, how is life? I missed you!

- Maria. My beloved Maria. How much have I missed you!
- Oh, Guts! Come here and hug me! – no, Mrs. Mimi, do not go away from home!

And then we talk. Talk about everything. New home, new marriage, how was the wedding, the cake, the party. Her father walking her down the aisle. Her uncle walking her down the aisle. Family. New job. Trip to Recife. Trip to Japan. Pregnancy. Life in Berlin. Berlin. Brasilia. Real state bubble in Brasília. Cheap prices of Berlin. Germans. How serious German are. Beer. Brazil. World Cup. Dinner invitation. Risotto. Acarajés. Brownies.

Conversations. As predictable and unpredictable as they always are. But some things I didn’t have time to tell Thereza, Leo, Maria… It is just that there are those small things that happen in our days, which change them. Those things that make us feel like we belong. And if you do not pay attention you won’t even notice them, cause they come and go like this. So, I share with you what I didn’t tell.

I spent last Christmas in a small village near Bonn. It had a population of 600 people. While I walked there, I could see some people looking at me with curiosity. In that Christmas week, the only store from that village was closed. So I couldn’t buy any food to contribute to my hostess home, which made me feel ashamed. I was warmly received in one authentic German Family Christmas dinner. As a gift to her nephews, I gave a Mickey and a Minnie. But they didn’t give it much attention, because they wanted to read their new books.

Last January I came back from Barcelona to a very cold and dark Berlin. One day, when I was taking my regular bus to go to school, I experienced my first traffic jam there. And the bus was overcrowded in a way that wouldn’t make any Brazilian bus look bad. While I waited there for 10, 20, 30 minutes, I started to feel suffocated. I felt like this not because of the number of people in that bus. What made me lose my breathe was the thick silence inside that bus. I felt like screaming because it was unnatural for me that 60 people remained silent for half an hour.

During summer, I worked for Allversity, an internet startup from Berlin. Our launch party was held very near my home, so I could walk there. It is also important to tell that this party happened during one of the hottest weeks of the year. We were suffering with the hot weather for about 4 or 5 days. After 5 hours of party, it started to rain. A very strong rain, with thick raindrops. The natural instinct of everyone was to go inside the house to protect themselves from getting wet. However, in a few minutes the guests could see that among those heavy raindrops there as a group of people, lightly dancing and singing as if they were children again. I was among those people.

Around April, sun was out and everyone started to enjoy it. One day I decided to go to a park near my home to study. I arrived at my chosen spot and opened my blanket. I took my texts and started reading. I could hear in the background a child laughing, playing with her father. Near me there was a teenager playing Frisbee with his dog. It was very good to be outside again. And the best part was that, since I was laying down, I could see the grass with countless small flowers, you know those small ones that you can easily miss? They had small white petals. Well, near almost every single one of those flowers there were some bee, silently working. Each one of them paying attention to their pollen. I saw that and I realized that there was an entire world filled with life around me. It was happening despite of me. I smiled and got back to my texts.

terça-feira, 14 de janeiro de 2014

O que não disse





Depois de um tempo aqui no Brasil, a vida finalmente encontrou seu ritmo. Acordo num determinado horário. Como, almoço, faço o lanche da tarde... Passeio com o cachorro, vejo amigos e deito em frente à televisão. Durmo. As coisas se repetem num ritmo que me embala e me faz sentir-me em casa.
Além de a vida ter encontrado seu ritmo, eu também encontrei muitas coisas por aqui. Encontrei inúmeros cadernos de 10 anos atrás que eu guardava. Estavam lá, parados, do lado de um bolo de notas fiscais de 7 anos atrás. Ambos esperando, sem sentido. Encontrei cartinhas de possíveis namoradinhas da quinta, sexta, sétima série. Todas casadas hoje. Encontrei documentos de estágio, documentos de vestibular, documentos de nem-sei-o-que. Acho que revirei tanta coisa, que reencontrei até minhas alergias, há muito esquecidas. Mesmo entre um espirro e outro, eu gosto de rever coisas antigas. Algumas se revelam inúteis e vão pro lixo. Outras a gente decide esperar mais cinco anos antes de jogar fora. E outras ficam. Guardadas.
Mas eu não fiquei só encontrando boletos bancários de curso de francês de 2007 não. Nesses dias tenho reencontrado muita gente. Muitos amigos. E quer saber? A vantagem é que as amizades não ficam esquecidas em uma gaveta, paralisadas, acumulando poeira. Cada um dos amigos que revi continuou sua vida, com novas conquistas e desafios, novos cabelos e novas barbas. Fiquei feliz de me reencontrar com eles. De ver que continuavam aqui, despoeirados.

- Oi, Gu! Que bom te ver!
- Thereza! Que gostoso te ver também! Como você está?
- Ai, Gu, tá ótimo, casa nova, casamento...

- Micheli!!! Você está igualzinha!
- Que saudades, Gu! Toma pra você, uma lembrancinha!
- Não precisava, Mi! Obrigado!

- Ai, Paulinha, nossa cara vir pra livraria cultura, né?
- Gu, os vendedores daqui me conhecem pelo nome! Eu e o Rodrigo estamos aqui todo fim-de-semana.

- Gustavo Carneiro! Como assim você não me ligou ainda? Se esqueceu de mim?
- Desculpa, Leo! Nunca me esqueceria de você! Me conte de sua vida! To com saudades...

- Maria. Minha amada Maria. Que saudades que estava de você!
- Guts! Me dá um abraço! - Não dona Mimi! Não foge não.

E a conversa vai pra assuntos leves e novos. A casa nova, o casamento, a festa, o bolo.
A família. O pai que a acompanhou ao casamento. O concurso que vai chamar. A viagem a Recife. A viagem ao Japão. A gravidez. As lembranças de Berlim. Minha vida em Berlim. Berlim. Brasília. Bolha imobiliária. Berlim. Seriedade dos alemães. Brasil. Imagina na Copa?  Facebook. Valesca Popozuda. Convite pra jantar. Risoto. Acarajé. Brownies. 

Conversas. Tão previsíveis e imprevisíveis como elas sempre são. Mas teve algumas coisas que não consegui falar pra Thereza, Leo, Maria... É que existem alguns acontecimentos pequenos que transformam o nosso dia a dia. Que nos fazem sentir como parte de um lugar. Que se apresentam a nós e nos conquistam, mas continuam seu caminho, sem parar pra nos dar mais encantamento. Compartilho, então, o que não disse.


Passei natal em uma pequena vila de 600 habitantes, perto de Bonn. Enquanto passeava, pude ver cabeças nas janelas me analisando. Na semana do Natal a única loja da cidade estava fechada. Não pude comprar nada de comida pra colaborar na casa da minha anfitriã, o que me deixou um pouco constrangido. Mas fui acolhido numa autêntica ceia de Natal alemã. Dei um Mickey de presente pros sobrinhos dela, que não deram a mínima. Só queriam ler os livros que o avô tinha dado.


Em janeiro voltei de Barcelona para uma Berlim bem escura e fria. Um dia, ao ir pra escola, peguei meu primeiro engarrafamento em terras alemãs. Estava em um ônibus lotado. Desses que não deixariam nenhum ônibus brasileiro com vergonha em termos de passageiros por metro quadrado. Enquanto esperava 10, 20, 30 minutos, comecei a me sentir sufocado. Estava sufocado não pelo pouco espaço que eu tinha pra me mover ou pelo ar viciado partilhado por tanta gente. O que me sufocou foi o silêncio denso que fazia naquele ônibus. Eu senti vontade de gritar, pois não é natural que 60 pessoas permaneçam 30 minutos em silêncio daquele jeito.



No verão trabalhei na Allversity, uma companhia de internet iniciante aqui de Berlim. A inauguração do nosso site foi feito a poucos quarteirões da minha casa. Me vesti e fui pra lá a pé. Ah, sim, é importante dizer que a festa aconteceu na semana mais quente que vivi em Berlim. Já tinha uns 4 ou 5 dias que a cidade estava abafada. Ninguém estava aguentando fazer nada. Pois bem. Depois de umas 5 horas de festa, começou a chover. Chuva forte, com gotas grossas. O instinto natural de todos que estavam na rua foi entrar na casa, para se proteger da chuva. Mas em poucos minutos os convidados da festa conseguiram ver que dentre as gotas pesadas havia um grupo de pessoas leves, dançando e cantando, como se fossem criança. Eu era um deles.


Por volta de Abril, o sol saiu e todos começaram a aproveitá-lo. Um dia aproveitei e fui estudar no parque que tem perto de casa. Cheguei e estendi minha toalha. Peguei meu texto e comecei a ler. Ao fundo escutava uma criança rindo, brincando com o pai. Perto de mim via um adolescente jogando frisbee pro cachorro. Foi gostoso estar ao ar livre. Mas o melhor foi que, deitadinho no chão, consegui olhar rente à grama e ver que haviam várias flores no campo, dessas que parecem erva daninha, sabe? Eram rasteirinhas e com pétalas brancas e curtas. Pois bem, junto dessas flores tinha, no parque todo, inúmeras abelhas trabalhando em minha volta. Cada uma prestando atenção no seu pólen. Percebi que tinha um mundo inteirinho acontecendo à minha volta. E eu voltei a ler meus textos.